Fotos de César Ferreira, originalmente publicadas no Urgente!
Cenas da enchente em Ururaí
As recentes enchentes que têm assolado o município de Campos e, mais drasticamente, a comunidade de Ururaí, trazem à tona mais um descompromisso que a administração pública têm tido com a população da cidade: a manutenção dos canais artificiais que cortam a planície e drenam suas águas. A história de ocupação da planície Goytacá foi esquecida junto com a tribo indígena que deu nome a cidade – que, por sinal, chamamos assim porque era desta forma que os tupis se referiam a ela, e não como eles próprios se intitulavam.
Durante a primeira metade do século XX a planície possuía um intricado sistema hídrico, composto em sua maioria por rios, lagoas, brejos e aluviões. Boa parte do solo era inundado durante todo o ano, principalmente durante o período de chuva, quando os rios e lagoas estavam cheios e transbordavam. As águas do rio Paraíba do Sul, por exemplo, atingiam a lagoa Feia – que naquela época possuía o dobro do tamanho que tem hoje. Existe, inclusive, um curioso caso que ocorreu durante uma grande cheia em 1906, quando um jacaré-do-papo-amarelo (ururau) foi encontrado na Pelinca ao baixar das águas.
Todos esses brejos, lagoas e aluviões eram malditos por serem focos de doenças e dificultarem a expansão da agropecuária no imenso território vizinho à capital do país. Pessoas ilustres como Alberto Lamego e Saturnino de Brito já diziam, àquela época, que havia necessidade de se intervir e “domar” a natureza, para abrir espaço às lavouras de cana e ao gado. Desta forma, o extinto DNOS (Departamento Nacional de Obras e Saneamento) iniciou o ambicioso projeto de drenar as águas da planície, que permitiria tornar cultiváveis os riquíssimos terrenos aluvionares, repletos de nutrientes trazidos da região serrana.
Com isso se deu a construção do canal das Flexas - que liga a lagoa Feia ao mar e foi responsável pela redução do espelho d’água da lagoa em 50% - e a retificação de alguns rios, como o Ururaí. A retração das águas foi muito comemorada pelos usineiros e por donos de terras adjacentes à lagoa Feia, que foram anexando áreas da lagoa a seus terrenos conforme a água baixava. O sistema funcionou muito bem enquanto as comportas e os canais – inclusive aqueles mais antigos como o Campos-Macaé, vulgo ‘Valão’ – sofriam manutenção regular.
Atualmente, porém, a história é outra. As comportas a muito não funcionam e os canais estão assoreados, não cumprindo mais sua função de drenar o solo. Como resultado as lagoas, brejos e aluviões que haviam sido drenados estão voltando a aparecer. O problema é que ao longo desses anos a cidade cresceu e as pessoas, principalmente aquelas ignoradas pelo poder público, ocuparam não só as margens como áreas onde antes havia água. O resultado está aí, pra todo mundo ver. Um caso bem ilustrativo é o da estrada dos ceramistas, que foi construída em cima de uma lagoa e, a despeito do orçamento milionário do município, não foi construída sobre pilastras nem nenhuma outra solução de engenharia. Com a enchente do Ururaí a lagoa simplesmente reapareceu no meio da estrada - e não foi a primeira vez.
Sob esta ótica pode-se dizer que a natureza está, simplesmente, retornando as suas origens. Pegando de volta o que é dela. Como um animal que foi preso numa jaula e, por negligência, alguém deixou a saída desimpedida.
Mais uma vez a administração pública do município mostra sua incompetência. Acho que inclusive por má fé mesmo. Só pra manter o povo na miséria e ser mais fácil se reeleger por meio de campanhas populistas. O pior é que, se levarmos em conta o período como governadora, com Rosinha Garotinho são será diferente. Ano após ano a cidade tem sido administrada sem se olhar nem pro passado nem pro futuro. É como se o município estivesse equilibrado num espaço-tempo metafísico onde só importa o agora e o ‘eu’, e salve-se quem puder! Quero ver o que vai sobrar no pós-Royalties...
quarta-feira, 3 de dezembro de 2008
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Um comentário:
Ou a revolta das lagoas...
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